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quinta-feira, 28 de abril de 2011

postheadericon A distância entre o discurso e a prática


O governo aproveitou a primeira reunião do Conselhão – um balaio de gatos que junta dezenas de lideranças empresariais, sindicalistas, artistas e gente de todo o tipo – para reafirmar o compromisso com o combate à inflação. O que mais espanta é que, nesta altura do campeonato, com os preços em franca disparada, ainda se esteja tendo de perder tempo em tentar convencer o público com o gogó, ao arrepio de ações concretas.

Mais grave ainda é que Dilma, Fazenda e Banco Central agora se manifestam em uníssono, atribuindo a inflação a fatores globais. Apontam todos para o culpado errado. Guido Mantega chegou a dizer que não estamos tão “mal na foto”, embora os próprios dados que apresentou ontem indiquem que a escalada de preços no Brasil só perca para as da Índia, Rússia e Argentina.

O diagnóstico é equivocado porque o país sofre com uma inflação diretamente resultante da leniência do governo passado, que disparou os gastos públicos e incentivou crédito e consumo além da conta para eleger a atual presidente. Ou seja, ao fator global, que efetivamente existe, juntam-se razões absolutamente domésticas. Paga-se hoje o que poderíamos chamar de “custo Dilma”, vitimando principalmente os mais pobres e quem vive de salário em geral.

Isso é fato, que até a presidente enfim admitiu ontem, embora meio a contragosto: “Além dessas pressões internacionais, hoje, nós sabemos também – e não vamos esconder esse fato – que a nossa inflação subiu devido a choques internos”, registrou a Folha de S.Paulo. A postura contrasta com o que ela vinha defendendo – inclusive em sua mais enfática manifestação recente sobre o assunto, na entrevista que deu ao Valor Econômico em março.

Os números oficiais confirmam o peso desproporcional e fundamental do gasto público na atual disparada de preços. Mantega escancarou-os ao Conselhão ontem. No ano passado, em que o país crescia vigorosamente, foi praticada uma política fortemente expansionista e as despesas públicas subiram quase 20%.

A maior parte dos diagnósticos sugere que é preciso desacelerar gastos e, consequentemente, a economia para conter a inflação, unanimemente tida como o mal maior a ser evitado. Mas neste ano as despesas do governo voltarão a crescer com força: mais 7,1%, ou quase o dobro do que o crescimento projetado para o PIB. Segundo Mantega, é para “não matar a galinha dos ovos de ouro”. Desdenha ele que a inflação é capaz de dizimar todo o galinheiro.

A distância entre a preocupação com a inflação e as ações da equipe econômica também pode ser verificada por outro aspecto: os juros, principal arma para debelar preços. Cristiano Romero mostra hoje no Valor Econômico que o último aumento, decidido na semana passada, na realidade resultou numa taxa de juro real mais baixa do que a que vigorava dois meses atrás.

Em princípio de março, a taxa real estava em 6,88% ao ano e agora caiu para 6,65%, considerando os juros futuros de 360 dias e as expectativas de inflação para os próximos 12 meses. A despeito de a inflação só ter aumentado, o juro de hoje é praticamente o mesmo de janeiro. “Em resumo, o quadro é este: enquanto os agentes do mercado acreditam que a inflação será maior neste e no próximo ano, o BC pratica juro real menor para enfrentar o problema”.

As contradições petistas também se manifestam na intenção de conceder os aeroportos à iniciativa privada, agora oficializada. Trata-se de medida tão aguardada quanto sistematicamente postergada pelo PT ao longo dos últimos oito anos. As concessões sempre foram demonizadas na gestão Lula, com aval da então chefe da Casa Civil e hoje presidente da República.

A pressa de agora justifica-se pelo cenário de caos que já se vive nos aeroportos brasileiros e que só tende a aumentar. Dos 67 terminais administrados pela Infraero, cinco já deverão ser concedidos até julho, com investimento de R$ 4 bilhões. Mas, mesmo quando estiverem prontas, as obras de reforma dos terminais já chegarão defasadas: daqui até a Copa, o fluxo de passageiros deve crescer 45%, superando em muito as projeções da Infraero.

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